- Conto Vencedor do concurso realizado pelo TRT-MG em 2009 - Tema: "Conciliação". By Eu mesma =)
Era um domingo comum, entrei no meu escritório, sentei em uma cadeira, pousei o rosto sobre as mãos e coloquei-me a refletir sobre essa vida de cartoonista. Pensei no quanto essa profissão me completa e como minhas obras agradam os leitores. Só passava por minha mente os pontos positivos chegando a esquecer a cobrança do meu patrocinador que aguardava ansioso a edição “premium” da revista em quadrinhos.
Era um domingo comum, entrei no meu escritório, sentei em uma cadeira, pousei o rosto sobre as mãos e coloquei-me a refletir sobre essa vida de cartoonista. Pensei no quanto essa profissão me completa e como minhas obras agradam os leitores. Só passava por minha mente os pontos positivos chegando a esquecer a cobrança do meu patrocinador que aguardava ansioso a edição “premium” da revista em quadrinhos.
De repente um barulho estranho vindo da mesa retira minha concentração. Parecia o zumbir de mil moscas juntas e ao pensar nessa hipótese me distanciei do objetivo em um só salto. O ruído persistia, aos poucos comecei a achar que eram vozes sobrepostas e em uma conversa desorganizada, então resolvi me aproximar.
O que vi e ouvi me deixou estático, as páginas da minha edição especial estavam em branco. Na verdade todos os balões de falas e pensamentos estavam lá, mas não havia sequer um personagem para fazê-los ter sentido. Olhei a uns trinta centímetros dali e me deparei com cerca de vinte figuras de um milímetro de espessura cada, com expressão de indignação. Todos se puseram a me olhar como desejando que desaparecesse.
Achei que estava sonhando, mas quando Felizberta, a primeira personagem que criei, cuspiu grafite em minha face vi que se tratava de algo tão verídico quanto grave. Antes que perguntasse o porquê daquilo, ela disse enraivecida:
- Como você pode ver, meu caro criador, estamos aqui reunidos como forma de protesto. E antes que eu pudesse me manifestar, prosseguiu: _ Eu e meus colegas estamos cansados de agir apenas para fazer seu cliente, digo, seu leitor mais alegre, cair em arapucas e entrar em confusão conforme você escreve o roteiro.
Neste instante, Ramiro que era o melhor amigo de Felizberta nas histórias, se pronunciou: - E o que ganhamos em troca? O fato de existir apenas e talvez alguma diversão entre uma história e outra? Nem roupas novas ganhamos, estou desde a primeira edição da revista com este “modelito” cor de mostarda.
Agora era a vez de Chiquita falar: - E que ideia foi essa agora de inventar mais uns dez personagens para contracenar conosco, como se não bastasse os outros fatores ainda temos que lidar com a competição. Neste momento houve discórdia entre os personagens novos e antigos e eu apenas observei.
Estava chateado e irritado com toda aquela algazarra quando um deles gritou: - Estamos em greve por tempo indeterminado! A raiva tomou conta de mim completamente e disse em bom tom sem refletir sobre minhas palavras: - Quem vocês pensam que são? Eu criei vocês, devem a vida a mim. Olhem seus tamanhos e o meu, vêem a diferença? E em seguida com força tentei pegá-los e colá-los nas páginas do cartoon, mas foram mais rápidos que eu se escondendo em diferentes partes do cômodo.
Agora eu podia me desesperar, não tinha minha edição pronta e faltavam poucas horas para o prazo de entrega vencer. Meu patrocinador não acreditaria nessa história. Chegada a hora da entrega, não solucionei o problema então ouvi coisas do tipo: - Quem você pensa que é? Se não fosse por mim mal teria como viver. Olhe sua posição diante da minha. Foram palavras terríveis.
Não sei se por compaixão meus personagens saíram dos esconderijos e disseram: - Nós fizemos greve! Meu superior ficou assustado, achou que estava ficando louco e iniciou-se uma discussão desorganizada entre as três partes até então envolvidas. Foram gritos, ameaças e exigências.
A situação estava tão descontrolada que vazou do meu escritório e de repente uma luz intensa entra transpondo a persiana. Seria Deus? Não, apenas o farol alto de um carro. Um senhor que se apresentou como presidente da associação de cartoonistas desceu e tinha intenção de apaziguar a situação. Calmamente conseguiu atenção de todos, propôs soluções eficientes, estabeleceu novas condições de trabalho e mostrou que não haveria complexidade caso desde o início tivéssemos tomado atitudes pacíficas.
Ficou decretado que trabalharíamos como equipe já que dependemos um dos outros mutuamente, revimos a questão da remuneração e as formas de expor nossas insatisfações sem perder o equilíbrio. Fim da reunião, sorrisos nos rostos, tudo estava solucionado.
O senhor misterioso que promoveu a paz foi embora. Fiquei sabendo mais tarde que não era ele o presidente dos cartoonistas e nunca mais o vi; apenas encontrei um cartão que ele deixara cair com o nome da empresa que trabalhava; algo do tipo: “Céu e companhia Ilimitada, departamento de ajuda ao trabalhador terrestre”.